Tuesday, June 19, 2007

O Brasil - país que me busca

O Brasil... o Brasil é um país de todos, um país sentimental, romântico. Eis o meu país, o país do futuro, de um passado trágico, de um presente ausente. O país das arenas políticas, das matas virgens, de índios selvagens, ingênuos, de negros poderosos, cheios de energia e vigor, acorrentados e humilhados, de brancos cruéis e sutis, moderados e astutos. O Brasil é o país do mestiço, da malandragem, do futebol, da umbanda, da feijoada, do churrasco, da cervejinha depois do trabalho, da passarinha, do arrumadinho, da caipirinha, da moqueca de camarão, do sururu, do caruru, do vatapá, do acarajé, do açaí, do chimarrão, da galinha cabidela, do abacate, da manga-rosa, da prosa afiada, da piada, do riso desgovernado, do governo mal-criado, do vizinho chato, do sincretismo, do abismo social, do asfalto, das favelas, do banho de canal, da lama, da fama, do caos, do carnaval. O Brasil é o país das misérias, da fome, da inveja, do egoísmo, do modismo, do achismo, da falta de delicadeza, da falta de educação. O Brasil é o país do sonho, do imaginário, do folclore, da festa de rua, do forró, do Rio Amazonas, da cantiga de roda, do partido-alto, do samba, do rap da quebrada, do cordel, do repente, do cinema-novo, do novo, o novo. O Brasil é um país novo, um país com cara de povo, que é refém de representantes elegantes, hábeis em se perpetuar no poder, atingindo-nos todo dia às 8 da noite nos seus telejornais. Tal como burlar esta imprensa burlesca, nós precisamos de mais. O Brasil não merece ser só isso. Merece o nada como antinomia, merece uma pimenta na cara desses coronéis donatários, merece uma bufa no nariz desses burocratas, merece uma revolução nas reitorias das universidades particulares, merece um assalto a diversos bancos, merece concertos de Nana Vasconcellos, merece Tom Zé no Planalto Central, merece Caetano, Gil, Betânia e Gal, merece Chico, merece Chico Science vivo na história, merece uma história diferente, um Sertão de veredas viáveis, de fartura, de ternura, merece um Lampião nos Pampas para derrotar aqueles latifundiários que se acham alemães e italianos de uma figa. Merece um Cartola em cada jardim, um Romário em cada chance de gol, um Reginaldo Rossi em cada desilusão, uma Adriana Lima em cada tapete vermelho, um Zé Celso Martinez em cada oficina, umas Clarices, umas Marias, uns Josés, uns Mários... merece um Durval Lôbo em cada fim-de-semana, um Mestre Bimba em cada ginga, um Villa-Lobos em cada acorde, um Guimarães Rosa em cada estância, um Castro Alves em cada praça, um Glauber em cada cinema. O Brasil merece mais, e por isso vai seguir em busca de muita coisa, de muita gente, e quem sabe... de mim.

Monday, June 04, 2007

Eu e as folhas

Eu escrevo a partir das dores de um tempo
De uma casa amarela,
Rígida como o vento
À insensatez do frio.

Eu escrevo diante das sombras
Do malefício causado pela guerra
Do desperdício de água,
Do vício em mágoas sob a Terra.

Eu escrevo com forma
Conforme as coisas me saboreiam e me desagradam,
Conforme eu esquento uma sopa
E anoiteço me desinformando.

Eu escrevo por acreditar nos homens
E por desacreditar,
Escrevo por onda de imaginar
Você, nós dois, o mundo inteiro,
Eu e as folhas.

Eu escrevo porque às vezes me parece tudo certo
E a maioria delas, tudo errado.
Eu escrevo porque canso vez em quando,
Porque cansei de narrar este fado.

Eu escrevo porque eu canto
E o meu canto é minha voz,
Minha estrada, meu caminho, a foz
Da alvorada que reivindica em mim o cômodo.

Eu escrevo por nada ser
Por nada e pelo ser,
Eu escrevo porque hoje me assaltaram meios segundos de felicidade
E me ocuparam como contraventor da moral e dos bons costumes
- coisa que muito me animou a perecer lutando.

Eu escrevo porque não há dinheiro em espécie que compre minhas idéias,
Meus restos,
Minhas sobras,
Minhas rédeas.

Eu escrevo porque não sou alegoria
De carnaval
Nem autor de um mundo elegante,
Sou apenas mais um escritor errante.